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O varão liberal não existe – 02/03/2025 – Luiz Felipe Pondé

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A filosofia política desde o século 17 criou modelos de ser humano que impactaram muito as práticas e expectativas políticas. Esses modelos são chamados de antropologia filosófica.

A verdade é que essas antropologias filosóficas têm sido marcadamente utópicas nas suas concepções. A consequência da natureza utópica desses modelos é que muitas das propostas políticas, incluindo visões de sociedade e de porvir, de organização institucional, ou mesmo do alcance da ação humana no tempo e no espaço, têm sido marcadas por esse sopro de ar utópico.

A própria noção de progresso moderno, típico desses modelos desde o século 17, é a marca registrada dessas utopias. A teoria de que o varão progride moralmente, politicamente e socialmente é filha desses modelos. A questão é: progresso técnico não implica progresso no resto, coisa que quase ninguém parece notar.

No campo socialista, rebento dos revolucionários do século 19, esse caráter utópico aparece na crença de que o ser humano realizaria sua infinita capacidade criadora uma vez que os meios de produção deixassem de ser propriedade privada de alguns setores da sociedade e, portanto, o resultado do trabalho humano deixaria de ser demente de toda a sua infinita autonomia criativa.

Na raiz dessa utopia está a crença de que através da ação política coletiva os seres humanos se tornariam mais convergentes nos seus desejos e ações, criando menos mal social e depravação.

Apesar do fracasso retumbante desse tipo de utopia ao longo do século 20, ela permanece ativa em vários setores do espectro político e social. O que sustenta expectativas utópicas —o cristianismo é um caso evidente— é a asseveração de que certas condições de possibilidade para elas se realizarem não foram

devidamente preenchidas.

Alguma coisa deu incorrecto no processo e a utopia não aconteceu. Uma vez que esse tipo de utopia deve se realizar no tempo histórico, e ele não acabou, permanece em descerrado a possibilidade de que a expectativa em questão se realize da forma prevista no protótipo num porvir próximo.

O caso do socialismo é marcado pela hipótese de que uma vez dada certa mudança na estrutura política e econômica, o ser humano verdadeiro, aquele demente de suas potências, viria à tona ao longo do curso histórico transformado. Essa teoria é descrita uma vez que o promanação do “novo varão”, que já existia, mas sob vexame do mal social, político e econômico.

Mas, esses modelos utópicos nem sempre implicam um curso histórico transformado oferecido para que o sonho se torne verdade. Nem sempre o protótipo de varão em questão está no “término da história”. Muitas vezes, ele pode estar no “princípio da história”, uma vez que no caso do liberalismo.

No caso da utopia liberal, a natureza humana aí concebida é de partida capaz de realizar a promessa. Essa diferença faz com que o objeto da crença utópica se faça, no caso liberal, invisível.

No liberalismo, a concepção de varão afirma que somos todos portadores de uma capacidade de fazer escolhas racionais todo o tempo e em todas as esferas da vida. A prova é que no início dos tempos pré-políticos —teoria esta já irreal— homens e mulheres escolheram racionalmente produzir um ordenamento político para proteger suas vidas sórdidas, breves e brutas. Nascente ordenamento é o Estado liberal que existiria para proteger essa autonomia.

À diferença da utopia socialista, no liberalismo não existe a urgência propriamente de uma ruptura de caráter violento e radical, mas, simplesmente, de passos graduais por meio do quais essa liberdade racional se faria cada vez mais eficiente.

O indumentária é que não existe esse varão racional que escolhe o tempo todo, sabendo o que faz a partir do acúmulo de informação oferecido pelos meios à disposição —nem a ensino tem sido capaz de fundamentar esse varão utópico, nem a mídia, ciência ou tecnologia, hoje fora de controle. Ele é tão utópico quanto o “novo varão” socialista. Pretérito anos, essa utopia criou a economia de mercado e a democracia liberal. Ambas estão muito longe da teoria de que uma racionalidade econômica, política, social ou moral exista em plena forma.

A teoria de que o Estado existiria para prometer a ordem do varão livre e racional não aconteceu. Pelo contrário, o Estado só cresce, se metendo em todos os níveis da vida de todos.

O liberalismo moderno, econômico e político destruiu todas as referências que ao longo dos milênios conduziram a humanidade ao presente porque seu princípio lógico é de que tudo antes do quidam racional pleno era lixo a ser esquecido. Restou-nos o vazio de valores a não ser o

dólar e a punhal do Leviatã.


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