Em 2013, a renda (PIB) por pessoa no Brasil havia chegado ao nível mais eminente da história. Em certa medida e na média, portanto, os brasileiros nunca haviam sido tão “ricos”. Portanto, rolamos ladeira aquém.
Somente no ano pretérito, em 2024, o PIB per capita superou aquele recorde, uma vez que pudemos confirmar nesta sexta-feira (7), com os dados do crescimento da economia divulgados pelo IBGE.
Foi uma temporada no inferno da Grande Recessão (2014-2016), da quase estagnação de 2017-2019 e do sinistro da epidemia (2020-2021). Foi uma depressão causada por tolice econômica e selvageria política em anos de azares para os quais não nos protegemos (secas terríveis, economia mundial em crises, queda do preço dos produtos que o país mais exporta).
O ano foi bom, sim. O desenvolvimento do PIB e do PIB per capita foi o maior desde 2011 (a subida do PIB de 2021, de 4,8%, não conta, pois em grande segmento foi recuperação do trambolhão de 3,3% do 2020 da epidemia). E daí?
O PIB e o PIB per capita são os indicadores mais precisos que temos de variação de renda ou produção, mas não lá muito precisos nem quanto ao que pretendem medir. Menos ainda são precisos quanto a bem-estar material, mesmo na média. Mas podemos ver por essas e outras medidas (consumo, trabalho, miséria etc.) que melhoramos um pouco.
Na minha medida mais do que impressionista e idiossincrática, em 2014 não via crianças vendendo coisas no sinal, pedintes famintos ou a selvageria de pessoas destruídas e largadas nas ruas do meio rico ou remediado de São Paulo. Alguns dos abatidos pela crise ainda estão lá, mas muitíssimo menos do que em 2023 ou antes. Até as multidões de zumbis sociais do meio velho da cidade parecem menores.
Não foi exclusivamente o PIB, evidente. O valor totalidade e médio dos benefícios sociais, Bolsa Família em particular, aumentou muito, embora, com tamanha melhora, a miséria já pudesse ter sido praticamente erradicada (há miseráveis que não recebem os benefícios). Miséria no sentido puramente monetário: a pobreza tem um monte de aspectos e pretexto danos de espécie variada.
Essa outra dezena perdida, a que começou em 2014, dá o que pensar. Tivemos aquela entre os anos 1980 e 1990. Crescemos muito pouco entre 1995 e 2003, entre o Real e o primeiro ano de Lula 1. Fins de Lula 1 e Lula 2 foram os melhores anos desde 1980.
Dependemos muito, uma vez que quase sempre, de ciclos de commodities (dos preços dos produtos que exportamos), por vezes fazendo bom uso da calma, por vezes não. Faz mais de 40 anos passou a última vaga de desenvolvimento longo e muito rápido, já logo desenvolvimento “forçado” no final dos anos 1970, incorrecto e marcado para morrer em uma crise grande, que enfim sobreveio, no início dos anos 1980. Estamos desde logo tentando concluir a travessia desse deserto, encontrando um oásis ou outro pelo caminho.
Parece inadequado ou exagerado falar de pretérito remoto em um dia que estamos a averiguar o mero resultado do desenvolvimento do quarto trimestre de 2024. Olhando os dados recentes, porém, o fantasma das ondas curtas de desenvolvimento parece emanar das planilhas. Ou pelo menos vem o pavor dos maus espíritos.
A economia desacelerou no final de 2024, mais do que o previsto. A baixa do ritmo em indústria e serviços impressionou. O consumo privado caiu 1% no quarto trimestre (na presença de o terceiro). Não se via tal coisa, baixa do “consumo das famílias” desde os anos da Grande Recessão (afora os anos da epidemia, evidente, que é outra história).
Poderia ser passageiro. Não deve ser assim, dadas as taxas de juros de arrocho, a redução do gasto do governo, que já não pode crescer mais sem motivar efeitos colaterais ruins, tumultos na economia e política mundiais e preços menos brilhantes das commodities. Alguma desaceleração haverá. Seria uma mera baixa cíclica do ritmo, amena? Pode ser. Chuta-se por ora que cresceremos entre 1,5% e 2% neste 2025, com encolhimento do PIB no segundo semestre.
Dados os erros de avaliação da economia, nos últimos quatro anos, até isso é muito difícil de saber. Sabemos pouco dessa (talvez) novidade economia brasileira pós-epidemia, pós-depressão, com peso maior do setor extrínseco (exportações e importações), talvez renovada em segmento por métodos e tecnologias novas.
Mas sabemos uma ou outra coisa. A economia parece aquecida além da conta, vide a inflação e o aumento de importações. Importante, a taxa de poupança é muito baixa (14,5% do PIB), neste século maior exclusivamente do que nos anos depressivos de 2016-2019 e do que em 2000-2001.
A taxa de investimento está em 17%. Taxa de investimento: quanto do PIB é talhado a ampliar a capacidade de produção de bens e serviços (novas moradias, instalações produtivas, máquinas, equipamentos, “softwares” etc.). Em 2024, foi maior exclusivamente do que, de novo, nos anos depressivos de 2016 e 2019 e do que em 2003, neste século. Os ciclos de desenvolvimento não irão muito longe ou também não terão ondas altas com investimento tão plebeu. O desenvolvimento do investimento em 2024 foi até melhorzinho, 7,3%, mas decresceu ao longo do ano.
Levante 2025 deve encetar sendo salvo pelo desenvolvimento da agropecuária, uma vez que em 2023. A sensação térmica do PIB será pior. Se o governo não fizer bobagem (tentar anabolizar a economia), talvez juros e dólar possam minguar mais cedo. Talvez em 2026 recomece um ciclo melhor. Mas alguns dos nossos problemas crônicos estão ali nas tabelas do PIB: investimento e poupança baixos, volatilidade subida.