Já reparou porquê inúmeros bens de natureza incorpóreo relacionados à herança africana no Brasil são hostilizados, marginalizados, desvirtuados ou usurpados por terceiros apesar de representarem secção muito importante do patrimônio cultural do nosso país?
Repara.
É assim com a umbanda, religião que reúne elementos do candomblé, do catolicismo, do espiritismo e das tradições indígenas, cujos terreiros são cândido da intolerância e do racismo religioso que fere a liberdade de douto.
Com a capoeira, essa mistura de arte marcial, dança e música criada por africanos escravizados.
Com o acarajé, o bolinho de feijão-fradinho oferecido aos orixás como oferenda —símbolo da ancestralidade afro na nossa culinária, que se disseminou nacionalmente a partir da venda nos tabuleiros de mulheres negras—, que ganhou uma versão gospel, o “bolinho de Jesus”.
Com o axé music –movimento cultural nascido na Bahia que simboliza a resistência negra e completa 40 anos esta semana– que tem letra de música alterada por cantora evangélica que acha por bem “cantar seu rei Yeshua” (Jesus em judio) para não ter de saudar Iemanjá, orixá feminina.
Com o samba, sentença da identidade cultural do povo preto que hoje é patrimônio cultural, mas já foi criminalizada por associação à vadiagem.
Nem mesmo o desfile de Carnaval das escolas (agremiações populares criadas por pessoas negras nos morros cariocas) que há décadas promovem um espetáculo espargido em todo o planeta, atrai milhares de pessoas e movimenta uma indústria bilionária (que só não enriquece os negros) consegue se safar incólume. Não bastassem os comentários racistas sobre crianças da flanco mirim de agremiações, oriente ano já teve até prefeitura denunciada no Rio Grande do Sul pela bizarrice de proibir desfile de escolas com enredo de temática ligada a religiões de matriz africana.
De uma forma ou de outra, a legado africana é frequentemente aviltada em território pátrio. É um negócio difícil de manter.