Em meio à discussão sobre a proibição do uso de celular dentro das salas de lição, eu passava por um detox de redes sociais e notícias. Deletei aplicativos, passei a me informar porquê os maias e os persas. Pela manhã, e só durante o moca da manhã, abria a versão do dedo do jornal no laptop, ia direto para a Ilustrada, depois, Cotidiano, deixava por último meus colunistas favoritos. O horóscopo me aconselhou a não me estressar, portanto evitei política durante todo o mês em que estive em férias.
O governo, as escolas, os professores, os pais, todo mundo preocupado com a submissão do dedo de Enzos e Valentinas, a queda no desempenho escolar e o aumento de bullying cibernético, mas ninguém olha para o seu umbigo, sequestrados pela atenção do próprio aparelho, onde navegam entre memes e receitas que nunca serão feitas. Além de restringir o tempo de celular de crianças e adolescentes, adultos deveriam rever a relação que têm com nascente pequeno aparelho sugador de almas. Esta semana, voltei a espreitar as postagens no Instagram, somente pela versão do app no desktop. Está todo mundo doido, e eu me incluo nessa sátira.
Qualquer frivolidade ganha relevância. Universal acha que precisa opinar sobre tudo. Muita gente gritando, pouca gente se ouvindo. Ostentação, superexposição, vaidade. Somos movidos pelos piores estímulos, escravizados pelo desespero de corroboração e de pertencimento. O meu jejum terá qualquer revérbero positivo? É verosímil consumir teor nas redes sociais sem ser consumida? Não sei. Talvez em poucos dias eu já esteja intoxicada novamente por likes e coraçõezinhos, passando alguma vergonha com posts sobre o look do dia ou uma opinião desnecessária sobre uma bobagem qualquer.
No último mês, estive sóbria. Do zero, meu dia passou a ter 36 horas. Porquê ficaram longas as minhas tardes. Lia livros, montava quebra-cabeça, tirava sonecas, escrevia o meu próprio romance, lia mais um pouco, assistia a séries e quando olhava o relógio ainda não era nem hora de perfurar um vinho. Meu celular passou a ser esquecido pela morada ou dentro da bolsa. As conversas não tiveram que dividir minha atenção com memes. A praia ficou mais bonita, os caminhos mais interessantes, a cidade conquistou meus olhos, que não estavam grudados numa tela.
Livros voltaram a ser meus companheiros constantes. Dentro de um táxi, no metrô, na sala de espera do dentista, enquanto aguardo um colega num restaurante. Levo um deles sempre comigo e a rima ao lado da mesa de cabeceira só cresce, não mais para se encher de pó, mas para ser lida. Só em janeiro foram cinco. Pela primeira vez em anos, passei a dormir sem qualquer muleta, incluindo tarjas pretas e suplementes naturebas. O sono vem, me leva e eu sonho. Resta saber se não sucumbirei ao pesadelo da submissão do dedo agora que as férias acabaram.