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Selo português de música une Jesus e Sex Pistols – 10/03/2025 – Juliano Spyer

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Estou viciado à flutuação dos evangélicos, mas fiquei sem palavras ao seguir o show de uma orquestra portuguesa de inspiração pós-punk liderada por dois pastores quarentões. Essa apresentação ocorreu na semana passada porquê secção da celebração dos 25 anos do selo Flor Caveira, em São Paulo.

O show aconteceu no Porão da Cerveja, um bar na Barra Fundíbulo que parece um templo punk: páginas de fanzines e animes decoram as paredes pretas. Cerveja, evidente, lanches veganos no cardápio, pessoas tatuadas e cheiro de maconha no ar.

No setlist da orquestra, referências ao grupo punk paulista Ratos do Porão, ao filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard, a Caetano Veloso e a salmos bíblicos. Apesar dessa mistura, a música não soa forçada ou pretensiosa nem tenta “passar mensagem”. Os músicos se divertem (jubilam?) até mais do que a plateia.

Flor Caveira é um selo músico criado nos anos 2000 por um grupo de amigos da mesma igreja batista no subúrbio de Lisboa. Dez anos antes, eram adolescentes que ensaiavam rock de garagem na igreja.

Fracassaram no projeto de obter sucesso mercantil, mas perseveraram na música.

O som das bandas ligadas ao selo Flor Caveira não é exatamente cristão. A religião aparece na mistura, junto com a influência de artistas porquê Bob Dylan, Johnny Cash e Sex Pistols. Pode parecer um tanto incompatível, porquê chuva e óleo, mas para eles uma coisa e outra vêm de Deus e expressam Sua venustidade.

No núcleo desse movimento está Tiago Cavaco. Pastor batista, escritor e músico, ele já foi descrito porquê um “Woody Allen evangélico”. Entendo a associação –a magreza de ambos, o envolvimento com a arte e a inquietação intelectual–, mas essa imagem é insuficiente.


Lasca conduz cultos de terno e gravata na Igreja Batista da Lapa, em Lisboa. Ele não leva uma vida dupla, mas no campo evangélico é reconhecido porquê um pastor tradicional e conservador. Em seu livro “Férias de Fornicação e Outras Murmurações de um Moralista”, por exemplo, dispara contra “teenagers abastados, saídos dos seus colégios católicos, conduzindo o viatura do papai para se deitarem com quem lhes apeteça”.

Além do show no Porão da Cerveja, o natalício da Flor Caveira proporcionou outro evento, levante sim evangelizante, voltado para jovens, na Igreja Batista do Povo, na Vila Mariana, com a presença de pastores famosos.

O Brasil é, assim porquê a península Ibérica, um território de encontros de povos. Mas o evangelismo à brasileira vem mormente das igrejas americanas e procura permanecer em uma bolha blindada. Existe aquilo que é “de Deus” e o que é “do mundo”. Logo, o consumo de arte e cultura costuma ser policiado e restrito a fontes autorizadas.

Por isso saúdo com exaltação o tropicalismo da Flor Caveira: sua despreocupação com o sucesso mercantil, seu desinteresse em usar a música porquê meio para metamorfosear. Sobretudo, celebro sua coragem de criticar a estética gospel porquê ingênua, artisticamente pobre e culturalmente submissa às tradições evangélicas dos Estados Unidos.

Vale conferir as playlists no Spotify.


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