Se existisse um aparelho capaz de captar as pulsações do mercado, a pesquisa no relatório divulgado hoje pela XP Investimentos seria um eletrocardiograma detalhado da mente dos maiores gestores multimercados da categoria macro do país. Produzida com 31 das mais relevantes gestoras do país, a pesquisa antecipa não somente as apostas, mas as viradas de crença que moldam as carteiras às vésperas de uma semana decisiva.
Nesta quarta-feira (7), o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Meão se reúne para deliberar o rumo da Selic. No mesmo dia, o Federalista Reserve também anunciará sua decisão de juros. Para completar o cenário de tensão, o mercado reflete os primeiros impactos da novidade política econômica do governo Trump, que tem causado incerteza global, revisões de incremento e reprecificação de risco nos EUA e fora deles.
Neste envolvente onusto, 81% dos gestores entrevistados acreditam que a Selic será elevada em 0,5 ponto percentual, saindo de 14,25% para 14,75% ao ano. Se confirmada, esta será a maior taxa básica desde 30/08/2006, ou seja, em quase duas décadas.
Os posicionamentos das carteiras confirmam essa leitura. O relatório mostra um aumento significativo das chamadas posições aplicadas em juros, aquelas que se beneficiam da queda das taxas. Significa que eles elevaram suas compras em títulos prefixados ou referenciados ao IPCA.
Em juros nominais, ou seja, investidos em produtos prefixados, o percentual de gestores aplicados saltou 39 pontos percentuais. Em juros reais, ou seja, os produtos referenciados ao IPCA, a subida foi de 8 p.p. E esse movimento não está restrito ao Brasil: os gestores também aumentaram posições aplicadas em países desenvolvidos e emergentes. O consenso parece simples: os juros globais estão próximos do topo.
No câmbio, a mudança foi ainda mais drástica. A aposta no chamado “dólar poderoso” — ou seja, na valorização global da moeda americana — perdeu força. Em março, 70% das gestoras estavam compradas em dólar; agora, somente 26%. Em sentido oposto, as posições compradas em real dispararam de 25% para 70%. O relatório sugere que segmento da explicação está na melhora tática da percepção sobre o Brasil e na procura por diversificação frente à fragilidade recente da economia americana.
Nas bolsas, o cenário é mais fragmentado. O otimismo com o Brasil também cresceu na margem, embora ainda não seja uma posição de consenso: 41% das casas estão compradas em ações brasileiras, perante 19% vendidas. O neutro (40%), que dominava, perdeu espaço. Já nos EUA, o excitação recuou de forma expressiva: hoje, somente 22% dos gestores estão comprados, contra 60% em janeiro. A pesquisa destaca que o extenuação dos dados econômicos americanos, somado à imprevisibilidade da novidade política econômica de Trump, levou muitos gestores a reavaliar o chamado “excepcionalismo americano”.
Mas talvez o mais interessante da pesquisa não esteja nas apostas em si, e sim nas mudanças de crença. O relatório mostra que os gestores não estão somente reagindo — estão tentando se antecipar. Estão percebendo que, posteriormente um longo e doloroso ciclo de aperto monetário, a maré pode estar começando a virar. E que os riscos, antes concentrados no Brasil, agora parecem mais difusos — pairando sobre Washington, Frankfurt e Tóquio.
Importante constatar que essa não é uma recomendação sobre uma vez que investir. O investidor deve entender que o horizonte de investimento e perfil de risco destes gestores pode ser completamente dissemelhante do seu próprio. Seguir estas mudanças de opinião é importante para entender uma vez que o mercado está se ajustando ao novo mundo que se desenha. Entretanto, é preciso tomar desvelo. Enfim, seguir quem observa o firmamento é tão perigoso quanto tentar pressentir para onde sopra o vento.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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