Você esquece onde deixou as chaves do carruagem ou o celular? Check. Tem dificuldade em manter o foco em tarefas entediantes? Check. Lê vários livros ao mesmo tempo e lentidão para terminar? Check. Sente incômodo com música subida quando está concentrado? Check. Esquece com frequência o que ia manifestar? Check. Sente sono pela manhã? Milénio checks. Sim para todas. Veredito: TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade).
O resultado veio mais rápido que um teste de farmácia para Covid. Os mestres em “medicina TikTok” não sabem quem eu sou, de onde vim, se bebo, se fumo, se durmo muito –mas, de tão experts que são, sabem muito mais sobre mim. Funciona assim: uma lista de perguntas de “sim” ou “não” é lançada e o resultado vem no final, junto com a récipe do remédio.
Se o mesmo questionário fosse feito a qualquer um que vive na loucura da cidade e no vício do dedo, a maioria provavelmente responderia “sim” para todas as perguntas. O diagnóstico correto? Viver em 2025.
Um estudo recente publicado em março, feito por pesquisadores da Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá, revelou um oferecido alarmante: dos sintomas relatados nos vídeos mais populares sobre TDAH no TikTok, que somam quase meio bilhão de visualizações, menos da metade se apoia em fontes confiáveis.
As redes sociais podem ser aliadas da saúde mental. Podem ajudar a espalhar informação de qualidade, aumentar a conscientização e combater estigmas e preconceitos. Mas, quando se trata de redes sociais, os likes são mais valiosos do que a ciência comprovada.
Em um vídeo, uma juvenil dança, aparece na tela uma relação de “sintomas” de autismo, porquê não gostar de usar meias, não misturar salada com o restante da comida e dormir com a TV ligada. “Coisas que eu achei que todo mundo fazia, mas na verdade são sintomas de autismo”, diz a legenda.
A vítima do outro lado da tela, deve baixar os dedos da mão para cada propriedade com que se identifica. Se fechar os cinco dedos: bingo! Positivo para o espectro.
Nos comentários, muitos usuários engolem o diagnóstico: “Me identifiquei com todas, socorro”, “Sim para todas, mas fui diagnosticada porquê TDAH e agora estou confusa”, “Estou descobrindo que sou autista com 56 anos”, “Me identifiquei com 4, devo me preocupar?”.
Os vídeos sobre TEA (transtorno do espectro autista) e TDAH estão entre as dez hashtags relacionadas à saúde mais visualizadas do TikTok. Dos mais populares com a hashtag #autism, só 27% tinham informações precisas sobre o transtorno. Alguns prometem a “trato” para o autismo, oferecendo pulseiras magnéticas, óleos essenciais e outras tolices. Até a ingestão de alvejantes foi recomendada porquê tratamento, que, pasme, alguns pais tiveram a insanidade de aplicar aos seus filhos.
Além de confundir a compreensão sobre transtornos, esse tipo de teor enfraquece a capacidade das pessoas de mourejar com suas emoções. É mais fácil rotular as falhas e passar longe das razões do sofrimento. A desinformação deturpa, esmaga, destrói. Planifica a pluralidade das pessoas.
Banalizar os transtornos é um problema grave. Fazer piada sobre eles não tem nenhuma perdão. Transformá-los em resultado e monetizá-lo é crueldade barata. Buscar engajamento usando a saúde não é só irresponsabilidade, é obsceno.
Entre o “check” e o diagnóstico, existe uma vida inteira que merece ser ouvida —e não reduzida a minutos de vídeo.