É fluente a constatação de que o cidadão Luiz Inácio da Silva é um ser analógico que não se adaptou aos novos tempos e, por isso, o presidente amarga uma impopularidade com a qual não estava habituado.
Também evidente é a dificuldade dele em mourejar com a situação e sua resistência a mudanças. Nem sempre foi assim. O político Lula (PT) anos detrás invocou Raul Seixas para se autodenominar uma “metamorfose ambulante”.
Na era, 2007, usou a sentença para explicar uma tentativa (fracassada) de ressuscitar a CPMF, o malfadado imposto do cheque. Antes disso, porém, já havia demonstrado que sabia se transformar se necessário.
Há 23 anos, quando disputou a eleição que finalmente venceria depois de três derrotas, Lula atendeu aos ditames da veras e se reinventou. Nas mãos de Duda Mendonça e com a ajuda da equipe de alter egos de escol: José Dirceu primeiro com Antonio Palocci, Luiz Gushiken, Luiz Dulci e outros do mesmo naipe na retaguarda.
Abandonou a receita esquerdista na economia, remodelou o figurino, vestiu ternos muito cortados, deu um trato no visual, aparou barba, cabelo e bigode para fazer o mesmo nas urnas em 2002. Venceu devido à mudança de perspectiva de si e das circunstâncias ao volta.
Portanto, capacidade de adaptação o presidente tem. Ou teve, no tempo em que contava com um entorno de gente realista, imune a deslumbramentos, calejada nas lides da negociação política e, sobretudo, com prosápia sobre ele. Companheiros desde a instalação do PT, logo um jovem de 32 anos, hoje na meia-idade dos 45 recém-completados e carente dos antigos quadros.
Agora relutante em atender aos alertas, obstinado em seu otimismo delirante, refém da soberba, Lula não cede à premência de furar espaço para a mudança ambulante que dizia ser. Prefere se alcançar àquela “velha opinião formada sobre tudo” conforme o verso, mas contradizendo a teoria de Raul.
Se não ouve os outros, Lula poderia escutar a si, aquele que soube a hora de mudar.
