Há um fenômeno nefasto no debate público: o exposição que tenta criminalizar discordâncias. Quem é contra cotas por raça em universidades, por exemplo, recebe a pecha de racista.
Tal comportamento avilta a lógica. Por fim, a sátira de uma política pública direcionada a determinado grupo não implica necessariamente ataque a esse grupo.
O exemplo mais recente veio do Reino Unido. A Suprema Corte do país decidiu que os termos “mulher”, “homem” e “sexo” na Lei da Igualdade de 2010 têm sentido biológica. Ou seja, a definição exclui pessoas transgêneros. Nas redes sociais, pulularam acusações de transfobia, até entre usuários brasileiros, para quem a apoiasse.
Mas a medida não elimina a defesa de pessoas transgêneros contra discriminação, ela só esclarece a garantia de direitos de homens e mulheres, porquê aproximação a espaços de uso individual por sexo —banheiros, vestiários, setores hospitalares e associações vinculadas a lésbicas e gays.
O diploma de 2010 protege nove categorias, incluindo sexo, orientação sexual e identidade de gênero. Na decisão, os juízes mostram que o intuito é varar incoerência. Tratar “sexo” porquê “identidade de gênero” comprometeria as definições de “varão” e “mulher” e, assim, a categoria “sexo” estipulada na lei.
A presidente da Percentagem de Paridade e Direitos Humanos, que aplica a Lei de Paridade, Kishwer Falkner, achou benéfica a consideração dos “desafios enfrentados por aqueles que buscam manter espaços exclusivos por sexo, e os direitos de pessoas atraídas pelo mesmo sexo de formarem associações”.
Note-se que o caso chegou à Suprema Golpe por uma ação do grupo feminista For Women Scotland, não por conservadores.
A partir de agora, sociedade e instituições do Reino Uno terão de se apropriar para fazer valer os direitos tanto das pessoas trans porquê os das mulheres.
Por isso a tentativa de criminalizar divergências é tão nefasta. Ela tende a bloquear o livre choque de ideias, que, nas democracias liberais, é fundamental para a produção de conhecimento e a avaliação de políticas públicas.