O recente incidente de violência registrado em um supermercado de São Paulo, no bairro de Campos Elíseos, onde um varão agrediu brutalmente sua esposa na presença de diversas testemunhas, expõe de forma alarmante a indiferença generalizada diante da violência contra a mulher.
As imagens das câmeras de segurança mostram o atacador desferindo socos contra a vítima enquanto a maioria das pessoas presentes permanecia imóvel, com exceção de um varão que tentou intervir. Exclusivamente depois repetidas agressões o grupo impediu que o atacador fugisse do sítio, permitindo que a Guarda Social Municipal o prendesse em flagrante.
A pusilanimidade do atacador, que não hesitou em espancar uma mulher em plena luz do dia, mas tentou fugir ao ser confrontado, é evidente.
A seriedade do caso sugere que, se investigado a fundo, provavelmente revelará um histórico de violência contra mulheres, o que deveria ser considerado pelas autoridades para utilizar a devida rigorosidade permitido.
A preterição da maioria dos presentes, embora lamentoso, não foi totalidade, já que ao menos impediram a fuga do atacador. No entanto, isso ainda está longe do que se espera de uma sociedade que preze pela segurança e distinção das mulheres.
Dados do Fórum Brasílio de Segurança Pública (FBSP), repercutidos nesta Folha durante esta semana, mostram que 91,8% das agressões contra mulheres ocorrem na presença de testemunhas, muitas vezes familiares, amigos ou conhecidos.
A pergunta que se impõe é: quantos desses espectadores são homens que, porquê os do supermercado, assistem passivamente à violência?
Esse cenário revela um problema estrutural que demanda ações concretas e urgentes por segmento do poder público, sem espaço para demagogia ou superficialidade.
A violência contra a mulher não pode ser tratada porquê um problema secundário.
É urgente que governantes e sociedade enfrentem questões porquê: por que homens agridem mulheres? Por que tantos se omitem diante dessas agressões? Por que a violência feminicida é tão naturalizada?
Essas perguntas exigem respostas e ações imediatas, que vão além de discursos ou medidas paliativas.
Mulheres são espancadas, estupradas e assassinadas diariamente, muitas vezes sem qualquer proteção ou justiça.
Outrossim, declarações porquê as da pastora Baby do Brasil, que recentemente sugeriu que mulheres devem perdoar seus agressores sexuais, mormente se forem da família, são profundamente irresponsáveis e reforçam a cultura de impunidade e submissão.
Mulheres não devem perdão a seus agressores, muito menos serem obrigadas a carregar a gravidez resultante de um estupro.
Essas posições precisam ser combatidas com firmeza por perpetuarem ciclos de violência e vexação.
Essa narrativa religiosa não pode se sobrepor às leis e à consequente responsabilização de homens que cometem crimes contra as mulheres.
Por outro lado, em termos de políticas públicas, não vemos muitos avanços. A taxa das mulheres segue sendo diluída e colocada porquê instrumento para capitalizar likes e atenção.
São poucas as pessoas com mandatos que verdadeiramente possuem o compromisso de abordar a questão da violência contra a mulher com seriedade.
Ficamos à mercê de discursos vazios e populistas, sem ações concretas para efetivar políticas públicas de ampliação da rede de enfrentamento à violência contra a mulher.
É absolutamente esgotante ser uma feminista séria nesse país. Se por um lado temos que mourejar com os ataques de “redpills” e o prolongamento de bancadas e discursos conservadores, de outro somos forçadas a ver essa questão tão urgente sendo tratada com proselitismo.
Por termo, é necessário desconstruir narrativas que tentam responsabilizar as mulheres, ou minimizar a responsabilidade dos agressores, ou colocar essa discussão porquê uma taxa “identitária”.
A violência contra a mulher é um problema estrutural grave, que exige a mobilização de todos —homens e mulheres— para ser erradicada.
Enquanto a sociedade continuar a tolerar ou ignorar essas agressões, estaremos falhando coletivamente em proteger metade da população.
A mudança começa com a conscientização, a instrução e a emprego rigorosa da lei.
Não existe mais qualquer espaço para preterição ou indiferença.