Existe uma crença geral de que quem tem muito numerário deve investir mais em ações. Essa teoria, repetida tantas vezes, parece até fazer sentido. Enfim, vemos frequentemente milionários e bilionários famosos que possuem uma grande segmento do patrimônio em ações e associamos isso a um padrão. Mas será que essa relação é sempre verdadeira?
Esse pensamento é fruto de dois vieses cognitivos: o viés de sobrevivência e a seleção adversa. O viés de sobrevivência ocorre quando observamos unicamente os casos de sucesso e ignoramos aqueles que fracassaram.
Os bilionários que construíram fortunas investindo em ações geralmente o fizeram porque seus negócios prosperaram, e não porque simplesmente decidiram alocar tudo em renda variável. No entanto, não vemos tantos exemplos daqueles que perderam grandes quantias apostando inexacto e concentrando em ações. Aqueles que quebram usualmente não ficam famosos.
Já a seleção adversa distorce ainda mais essa percepção. Costumamos saber unicamente os ricos famosos que fizeram riqueza porque suas empresas se tornaram grandes e abriram capital. Uma vez que esses são os exemplos amplamente divulgados, muitos passam a crer que a relação entre riqueza e maior alocação em ações é uma regra universal. No entanto, deixamos de lado todos os empresários que fracassaram, perderam patrimônio ou simplesmente construíram riqueza por outros caminhos e os milionários que não são famosos e que não possuem zero em ações.
Na prática, o montante do patrimônio não deveria ser o fator determinante para definir a alocação em ações. O que realmente importa é a tolerância ao risco, o horizonte de tempo e os objetivos financeiros.
Um investidor pode ter R$ 1 bilhão e ainda assim ter um perfil conservador, enquanto outro pode ter R$ 100 milénio e concordar percorrer mais riscos. A decisão sobre a parcela a ser investida em renda variável deve ser tomada com base no que faz sentido para cada pessoa, e não no tamanho da conta bancária.
Se há uma diferença entre grandes e pequenos investidores, ela está no roupa de que quem tem muito numerário geralmente pode executar seus objetivos financeiros com uma parcela dos recursos. Isso significa que, para o restante do patrimônio, pode ter mais flexibilidade para assumir riscos, sem comprometer sua qualidade de vida. Mas essa flexibilidade não significa que ele tenha perfil para percorrer riscos e que a única opção seja investir indiscriminadamente em ações.
Outro ponto importante é que ninguém está imune aos vieses comportamentais. O susto de perder, o excesso de crédito e a aversão ao remorso afetam tanto pequenos quanto grandes investidores. O roupa de alguém ser milionário não significa que tomará sempre as melhores decisões. Muitas grandes fortunas já foram destruídas por erros clássicos de alocação de ativos e apostas exageradas em mercados voláteis.
Esse mito de que “quem tem muito numerário deve investir mais em ações” se assemelha a outros equívocos comuns sobre pessoas ricas. Por exemplo, há quem acredite que todos os milionários dirigem carros de luxo ou vivem gastando sem preocupação. Na verdade, muitos bilionários são extremamente cautelosos com seus gastos e seguem rotinas financeiras disciplinadas. Da mesma forma, nem todo investidor com cimo patrimônio deve, necessariamente, ter uma exposição maior à Bolsa de valores.
A verdade é que investir muito não é sobre quanto numerário se tem, mas sobre uma vez que se aloca esse numerário de forma estratégica e alinhada aos objetivos. Em vez de perguntar se quem tem muito numerário deve investir mais em ações, a melhor questão seria: “Uma vez que estruturar um portfólio que faça sentido para minha verdade e metas financeiras?” Esse é o verdadeiro sigilo para preservar e multiplicar patrimônio ao longo do tempo.
Michael Viriato é assessor de investimentos e sócio fundador da Casa do Investidor.
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