Conecte-se conosco

Esporte

Contei que sou alcoólico para uma amiga de 20 anis – 24/02/2025 – Vida de Alcoólico

Published

on



“Desculpa. Eu nunca achei que você fosse me julgar. Mas eu sempre tive muita vergonha.”

Comecei a esboçar um bilhete para a Paula. Ela é minha amiga há pelo menos vinte anos e eu nunca tinha conversado com ela sobre o meu alcoolismo até a última quinta-feira, quando almoçamos juntas no nosso lugar de sempre. Estávamos comendo estrogonofe, meu prato predileto. (Eu sei, eu sei, você vai expor que meu paladar é infantil, mas tudo muito, não me importo.)

Fiquei com vontade de descrever tudo para ela. Nunca esqueço do dia em que estávamos fazendo sauna no clube e decidi tomar uma caipirinha. Era o lugar perfeito para me entorpecer. Escondida do mundo, junto dela, e longe de quem iria me recriminar pela bebida. Pedi logo de rosto uma caipirinha dupla, o que já foi meio estranho. “Alice, tem certeza que não prefere uma chuva de coco?” Imagina, ela não podia calcular o prazer que eu sentia em poder ingerir. Comecei a rir desenfreadamente e ela achou extravagante.

Minha mãe apareceu. Abriu a porta da sauna, viu meu copo e chorou. Dei um brado no momento em que percebi que estava sendo desmascarada. A sisudez daquela cena só poderia ser sentida por minha mãe, que sabia que não fazia nem duas semanas que eu tinha saído da internação.

Paula também nunca esqueceu. Ela me contou na semana passada, no almoço. Eu estava feliz de encontrar essa amiga querida e em um oferecido momento me dei conta de que ela não sabia de grande segmento da minha vida. Das internações, do AA, das dores que passei e que vinha enfrentando. Decidi transfixar a conversa. Falei que era alcoólico. Ela olhou para mim e disse que sabia. Lia as colunas.

Porquê assim?

“Você comentou comigo o filme ‘Dias Perfeitos’ falando exatamente aquilo que escreveu no jornal.” Ela ficou com a pulga detrás da ouvido e teve a confirmação depois que releu algumas passagens do blog. Sobre meu cachorro, a relação com minha mana.

Eu sabia que qualquer dia poderia ser invenção, mas não queria que justo a Paula soubesse dessa forma. A sensação que ela teve foi de que eu achava ela “muito boba”. Imagina.

Não tem a ver com ela. Por isso comecei a ortografar o bilhete. Quero que ela tenha a certeza do tamanho da minha amizade por ela. A questão é que eu tenho vergonha de falar do meu alcoolismo. Que coisa louca, não? Eu escrevo cá sem me exprobar…

Se, por um lado, achei muito triste, por outro confesso que foi prático. Paula disse que o paixão que sentia por mim nunca seria impressionado pela minha doença, que zero do que eu tivesse feito iria fazer ela gostar menos de mim. Penso que meu pavor se deve às tantas amizades que perdi por razão das minhas maluquices da ativa. É um traumatismo mesmo.

Faz quase dois anos que mantenho esse espaço e as alegrias só aumentam. “Alice, você viu que até o Ruy Castro elogiou sua poste?” Sim, Paula, eu vi. Mas zero se compara com a alegria de ver sua rosto feliz e com lágrimas nos olhos de finalmente poder conversar comigo sobre tudo. Você me deu a esperança e a certeza de que não preciso mais ter pavor de perder uma amizade porque eu estou no caminho perceptível e porque, porquê dizem meus companheiros de AA desde o primórdio do tratamento: “Você não tem culpa de ser alcoólico. É uma doença.”

É isso.


LINK PRESENTE: Gostou deste texto? Assinante pode liberar sete acessos gratuitos de qualquer link por dia. Basta clicar no F azul aquém.



Acesse a fonte

Continue lendo
Clique para comentar

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Chat Icon