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Faceta tradwife, seus vídeos me fascinam e desconcertam – 04/02/2025 – Joanna Moura

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Faceta tradwife que teima em surgir na minha timeline,

Não sei o que o algoritmo pretende ao martelar tanto no nosso improvável encontro do dedo, mas, depois de muito tentar ignorar sua presença nas redes, resolvi ceder às forças ocultas das plataformas sociais e ouvir o que você tem a expressar.

Queria principiar esta missiva afirmando que não libido travar uma guerra contra seu estilo de vida, muito menos invalidar sua escolha de terebrar mão de uma curso para se destinar ao lar e à família. Venho em missão de tranquilidade e diálogo.

Confesso que seus vídeos me fascinam e desconcertam em igual medida, me tirando da minha zona feminista de desconforto. Talvez seja a sua voz suave que contrasta tão violentamente com a velocidade 1.5 com a qual eu ouço as mensagens de voz do WhatsApp. Talvez seja a sua pele impecável e o penteado pormenorizado que afrontam minhas olheiras e a marca da espinha que espremi no queixo. Ou talvez seja a naturalidade com que você prepara refeições vestindo um traje de gala e segurando um bebê de oito meses no pescoço, enquanto eu requento a lasanha do termo de semana a bordo da roupa amassada que usei ontem.

Mas depois de semanas estudando seu teor e de algumas de suas colegas, ficou simples que o que me intriga nele não é a sua escolha por terebrar mão de uma curso em prol do zelo da morada e da família. Acredito que o trabalho doméstico e do zelo são absolutamente essenciais. Tão essenciais que deveriam ser valorizados e melhor remunerados, oferecendo garantias às mulheres que optam ou são obrigadas por suas circunstâncias a exercê-los.

Mas vamos combinar? A vida doméstica não é fácil. Pelo contrário, é cansativa e, na maior secção do tempo, não se encaixa no que consideramos “instagramável”. E aí, quando vejo você fazendo a manteiga que vai no bolo que o seu marido acordou com vontade de consumir, ou fabricando serenamente os giz de cera para que os seus filhos possam traçar, me pergunto: cadê aquela faxina caprichada do banheiro? E aquela dica de uma vez que lavar as cuecas do marido? Ou um papo sincero com voz de ASMR enquanto você dá conta de uma pia lotada de prato sujo? Porquê uma mulher que prega o retorno a um tempo em que nosso papel se restringia aos negócios domésticos, imagino que se ocupe também desses serviços menos fotogênicos.

Essa aura de leveza e plenitude com a qual você embala a vida doméstica me parece, portanto, propaganda enganosa. E aí fico genuinamente preocupada com as meninas mais novas, entrando no TikTok e sendo levadas a confiar que ser submissa é desancar bolo trajando paetês.

Aliás, se queremos permitir que essas meninas façam escolhas mais informadas, não podemos deixar de falar dos perigos de terebrar mão da independência financeira, mormente num país em que uma em cada três mulheres já sofreu violência doméstica e mais de 11 milhões de mulheres são mães solo. Sei que o seu marido não encostaria o dedo em você, ou te trairia e te abandonaria com filhos pequenos para fabricar, mas nem todo varão é virtuoso uma vez que ele, não é mesmo?

Gostaria, portanto, de lhe fazer uma sugestão em nome da influência responsável que eu sei que você deseja praticar. Que tal, daqui para frente, incluir um aviso de publi do conservadorismo nos seus posts? Assim acho que as coisas ficam mais claras.

Um amplexo desta mulher fã do progressismo e adepta de comprar a manteiga pronta no mercado.

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